Recordo que me fazia mal ao fígado quando via um ano escolar terminar e ver que os alunos após terminarem as aulas enchiam os contentores de trabalhos que tinham produzido com dinheiro da escola, manuais escolares e cadernos diários. Para mim que continuo a guardar religiosamente os livros do meu pai, os meus e os da minha filha, isso doía-me de forma muito particular.
Propus então às minhas colegas que desenvolvêssemos uma
campanha dinâmica junto dos alunos dos professores e dos encarregados de
educação, para forrarem os seus livros, manuais escolares e cadernos de
exercícios e só escreverem neles a lápis. No final do ano entregá-los-iam na
Escola para poderem ser utilizados pelos colegas que lhes sucedessem. Com o
dinheiro poupado seria adquirido material didáctico com o objectivo de melhorar
a qualidade de ensino que a escola desenvolvia.
Resta dizer que a campanha foi um êxito. Não só os alunos
com apoio da Acção Social Escolar, mas também aqueles que tinham adquirido os
livros por si próprios aderiram e tornaram possível um exemplo de solidariedade
de que nos orgulhámos.
Mas… Todas as coisas têm um mas que estraga tudo. O
coordenador da CAE-OESTE para este sector da ASE, veio à minha escola com
ameaças de que essa campanha era ilegal, que os livros dados aos alunos eram
pessoais e intransmissíveis e que ou eu terminaria com a campanha ou ficaria
sujeito a uma acção disciplinar pois ele queixar-se-ia de mim à IGE (Inspecção
Geral de Ensino). É claro que mal-educado como sempre fui lhe disse onde ele
podia meter a queixa que de mim quisesse fazer.
Engraçado. Poupávamos dinheiro ao Estado. Promovíamos uma
acção que evitava que os livros fossem parar à lixeira. Ensinávamos a tratar os
livros como amigos a defender. A qualidade de ensino na Escola melhorava e o
burocrata (é o mínimo de que o posso apelidar) ameaçava-me disciplinarmente.
Passados todos estes anos o Ministério vem promover uma
iniciativa que peca por tardia e vários defeitos. Desde logo por não ser
extensiva a todos os alunos. Depois torna-la obrigatória não dando oportunidade
aos alunos que embora sendo carenciados desejem preservar os seus manuais como
um tesouro do passado para o seu futuro. Por último, ameaçando os que são
filhos de situações mais disfuncionais com atitudes futuras que os tornarão
ainda mais marginais se falharem nas atitudes a que o Estado perdulário os obriga.
E aqui está como passando do 8 ao 80 continuamos presas
de quem não tem méritos para as funções que desempenha. E dizem-se cristãos
estes idiotas que nos governam.
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