AS CRIANÇAS E AS NOVAS CORRENTES DA
PEDAGOGIA
Como criar
condições para as crianças serem felizes? Estas são as interrogações que ao
longo do tempo têm sido feitas por cientistas que se dedicam à pedagogia ao
longo dos tempos. Isto porque são todos unânimes em considerar que crianças
felizes se tornarão adultos criativos, responsáveis e com um elevado nível de
sociabilização e tolerância.
Vou
recordar aqui um tempo da minha tenra juventude. Nesse tempo existia em Peniche
um médico (o Dr. Serra) que todos conhecíamos pelas suas idiossincrasias.
Casado com a D. Juvite (ou Judite?) era pai do Parrana que era da minha idade.
O Parrana (que mais tarde haveria de ganhar nome de gente, António Abreu Vaz
Serra) andava normalmente descalço. Por opção. Talvez não dele, mas do pai.
Passados mais de sessenta anos sou capaz de perceber porquê. O Parrana sentia
como nenhum de nós o tacto da terra e das pedras. E os pés dele foram desde
muito novo programados para se defenderem da agressividade dos caminhos, das
tripas do peixe (quando ía para a Ribeira) dos cacos que então se espalhavam
nas ruas, visto que não existiam varredores nem carros de aspiração de lixos.
O Parrana
estudou, acabou por ser oficial miliciano e tinha uma capacidade extraordinária
para o desenho. Eu próprio entre aqueles que mais admirei acabei por lhe
comprar um desenho a tinta-da-china de S. Leonardo e que figura na minha
galeria de quadros de gente de Peniche.
Hoje, os
pátios das escolas são de materiais à base de produtos derivados do petróleo, o
mesmo em relação aos parques infantis. As ruas são alcatroadas e percorridas
por batalhões de varredores e máquinas de aspiração. As ruas são locais para o
tráfego automóvel e deixaram de pertencer aos jogos de futebol entre crianças.
Estas calçam sapatilhas de marca para jogar. Os pés deixaram de ter contacto
com a terra e até no jardim se vêem empedrados para que a terra molhada não
incomode os pés incólumes dos cidadãos.
Já não se
joga à banca. E jogar às escondidas e aos polícias e ladrões deixou de ser possível.
Para que as crianças se portem bem à mesa dá-se-lhes um smartphone. E já nem os
desenhos animados são vistos. É panda e mais panda que invadem os canais pagos.
Não se ensina os nossos meninos a optarem pela TV2. Só por breves instantes as
nossas crianças sentem o cheiro a peixe. Já não há candonga. E os putos não roubam
peixe na Ribeira. Os Jardins Escola passaram a ser centros de formatação. E não
são os Educadores os culpados. Se não o fizerem serão tratados como párias.
Felizmente
que começam a surgir escolas alternativas. Onde as crianças ficam a saber que
quem põe os ovos são as galinhas. E que o leite não nasce no supermercado. Onde
é permitido às crianças sujarem-se com terra. E onde em épocas de chuva podem
saltar nas poças de água. Onde é salutar saltar à corda e jogar à bola com
bolas de trapos. Escolas onde existem árvores de fruta e onde se banqueteiam as
lagartas nas maçãs.
Tantos anos
depois, a minha homenagem ao Dr. Serra.
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