O
GREGO MALUCO E O SENHOR QUALQUER COISA
Por
Artur Pereira*
“Varoufakis é calvo como um mongol, reconhecidamente
inteligente, um sex symbol de mota, que como sabemos tem um simbolismo
psicológico poderoso. Vive à beira do vulcão é actor da história colectiva do
seu país.
Marques Mendes, na sua consulta semanal televisionada,
veio regurgitar indignação a propósito da, em sua douta opinião, comprovada
doença mental de Varoufakis.
O destrambelhamento do grego terá ficado óbvio após a
descoberta de um perverso plano B com a sua assinatura, que incluía a prisão de
governadores, roubos de identidade fiscal dos cidadãos, assalto a bancos, cerco
a empresários, enfim, o terror jacobino à solta nas ruas de Atenas.
“Este homem é louco e perigoso, é louco, louco…”,
prevenia um Marques encolerizado, ao mesmo tempo que apontava com o dedinho
para a cabeça, num esforçado domínio da linguagem gestual que merece registo.
Mas há um inconveniente neste suponhamos delirante do Dr.
Mendinho. O famoso plano B, que qualquer gerente de matadouro acautela para o
caso de as alimárias lhe falharem ao facalhão, nunca teve os factores
tenebrosos que Marques Mendes sublinhou espevitado.
Todo isso já foi denunciado, pela imprensa grega e pela
imprensa internacional, pelo Parlamento de Atenas, pelo primeiro-ministro
Tsipras, e até por políticos europeus.
Foi um boato inserido numa campanha de contra-informação,
ao bom velho estilo das campanhas psicológicas para destabilizar governos
legítimos. Faz parte do abecedário das técnicas do golpe de Estado.
É sempre preciso descobrir insondáveis intenções, agendas
ocultas, um projecto antidemocrático escondido aos cidadãos pelos governos
eleitos.
Foi assim no golpe de Estado no Irão de 1953, na Operação
Ajax, organizada pela CIA para derrubar o governo democraticamente eleito do
primeiro-ministro iraniano Mohammed Mossadeg, e foi assim no Chile em Setembro
de 1973, para derrubar o governo eleito e assassinar Salvador Allende, só para
dar dois exemplos.
O objectivo do boato, e de uma campanha negra, passa por
destruir e atingir a personalidade e a idoneidade do líder ou do rosto mais
destacado num processo de mudança ideológica e política. Destruído o homem,
debilita-se o símbolo, fragiliza-se a ideia e quebra-se a unidade.
Além de que o boato nunca é comprovado. É uma
especulação, um conjunto de afirmações imprecisas que no conjunto formam um
imaginário com fortes referências aos receios colectivos, à insegurança, à
suspeita, a mitos e preconceitos.
São os canais usados para o boato crescer, como credo ou
notícia, e o perfil dos emissores, que lhe vão dar forma e aparência de
credibilidade. O boato não precisa de conteúdo, precisa de espaço.
Ele deve criar o ambiente e as condições para que no
limite seja aceite como natural pela maioria da sociedade, sem praticamente
resistência ou com a indiferença generalizada, uma interferência externa, um
golpe ou a suspensão da democracia.
No Portugal pós-25 de Abril fizeram o mesmo. O boato foi
uma arma privilegiada de uma reacção ferida, desejosa de limitar e mesmo fazer
recuar as liberdades acabadas de conquistar. Muitos dos que nesse tempo, de
forma generosa e séria, lutavam por criar melhores condições de vida para os
portugueses eram acusados de loucos.
Nestas campanhas de contra-informação, que são parte
integrante do arsenal das guerras não declaradas, são as personalidades e os
governos visados que têm de se desmultiplicar nos desmentidos e na desmontagem
da falsidade.
Batalha quase sempre perdida, porque como o boato não
existe como elemento formal e material, como a sua origem é sempre impossível
de referenciar, é praticamente impossível provar o embuste daquilo que não se
consegue apresentar.
Marques Mendes sabe tudo isto, mas preferiu ser porta-voz
da perfídia, colaboracionista e cúmplice da farsa. Sente--se mais no tamanho de
Schäuble, é da sua natureza.
Preferiu o princípio, inventado nos anos 30 na Alemanha
por um antecessor seu na pasta da Propaganda, de que “uma mentira repetida mil
vezes passa a ser verdade”.
Logo o Marques é um intruja, o que nem é de admirar de
quem se especializou na fancaria política, a querer controlar alinhamentos dos
telejornais da RTP, e a censurar as agendas das redacções.
Claro que tudo isto pode encontrar simples explicação nas
indizíveis margens da complexa engenharia da alma humana. Quer dizer, pode ser
trauma.
foto do jornal i
Varoufakis é calvo como um mongol, reconhecidamente
inteligente, um sex symbol de mota, que como sabemos tem um simbolismo
psicológico poderoso, vive à beira do vulcão e é actor da história colectiva do
seu país.
A nós, que somos periféricos, saiu-nos o Marques Mendes
às voltas com Freud, sempre a olhar para cima, perseguido pelo maldito adágio
popular de que “homem pequenino, velhaco ou dançarino”.
E para dizer a verdade não o estou a ver dançar nada, nem
a macarena.”
*Consultor de comunicação
Escreve às quintas-feiras