REQUIEM PELO CINEMA PARIS
Tenho estado de férias. Os reformados também tiram
férias. Eu não sabia mas aprendi à minha custa. Como é que são as férias de um
reformado? Eu explico.
Se adoece ainda faz menos do que aquilo que já não
fazia. Se fica sem internet o reformado tira mais que fazer ao já não fazer “nadica”
de nada. Nestes momentos de férias o reformado dorme de dia e à noite não tem
sono. Quando chega o Natal, a decoração do “lar doce lar” ocupa os momentos já
tão expressivos de lazer continuado.
Foi num momento de férias assim que a notícia me fez
entrar em ebulição e me trouxe os meus dias de Campo de Ourique e da Estrela. O
cinema Paris, ali na Domingos Sequeira, vai ser demolido.
Regressei aos meus 16/17 anos aluno da Machado de
Castro e posteriormente do Instituto Industrial. Aos meus quartos alugados
naqueles bairros tão semelhantes a Peniche. Às minhas tardes de domingo no
Jardim da Estrela. Às milhares de vezes que passei junto ao Paris para ir para
as aulas ou quando vinha delas e ía para casa. As dezenas (centenas?) de vezes que
comprei bilhete e numa gazeta às aulas, fazia do Paris a minha Formação para a
cidadania. Eu, o Jorge Machado, o Joseph. O meu afilhado Luís. O Zé Maria
Martiniano. O Zé Puto. E tantos e tantos outros.
O Paris interrompeu-me as férias por tudo aquilo que
representou (e representa para mim). Campo de Ourique sem o Paris, sem o “Vergas”,
sem as tascas, sem o Jardim da Parada ou a Basílica é impensável para mim.
Estou a ficar irremediavelmente velho. As coisas que me
ajudaram a crescer vão desaparecendo, tal como as pessoas. Eu vou restando. Nesta
roleta da vida ainda não saiu o meu número. Sabe-se lá porquê. Por isso posso ainda
escrever sobre as minhas memórias. E sabe-me bem fazê-lo. Mesmo que esteja de
férias.
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