AS VIÚVAS DA MORTE
Todos os dias as encontro aí pelas 7,30 da manhã quando vou passear o meu cão. Duas mulheres vestidas de preto da cabeça aos pés, com mais de 70 anos, sobem a Av. das Escolas em direcção ao cemitério. Sempre as duas. Uma, 3 ou 4 passos à frente da outra. Alguns dias trazem um braçado de flores.
É o seu fadário o que começa assim todas as manhãs. Tratar do eterno repouso dos seus. Para isso vivem e assim vão alimentando e justificando o seu sobrar para os dias que já pouco lhes podem acrescentar. Passam por mim e dizem: - Bom Dia! Como quem diz vamos fazer o que é o nosso ser. Vamos estar com os nossos. Vamos limpar-lhes as casas e dizer-lhes bom dia.
E este ritual tem-se mantido. Se por acaso me atraso ou adianto e não as encontro, aguardo com ansiedade o dia seguinte. Com a idade que têm a sua companheira de todos os dias, A Morte, pode querer recompensá-las pelo tributo que todos os dias lhe prestam. E eu rezo à minha maneira para que se vá protelando esse encontro definitivo.
Aquelas duas mulheres são o Peniche profundo que já só por acaso se pode encontrar. Não se inventam em novas modas, nem em falsos pretextos de convívios espúrios. è a sua vida que está ali no seu caminhar ao encontro do que faz parte de si próprias. No amor que revivem cada dia em que fazem deslizar as mãos com carinho nas pedras tumulares das suas outras casas.
O seu ritual já faz parte de mim. Aquelas duas mulheres já têm o meu respeito e a minha amizade para sempre.
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