quarta-feira, abril 27, 2016


UM RETRATO DE COSTUMES

Nos anos 20/30 do século passado, a Associação era o centro da vida cultural e recreativa daquele tempo. A certa altura foi levada à cena uma opereta de cujos versos e músicas os autores se perderam no tempo. No entanto ficou um registo escrito desse “espectáculo” com o título “PEDARS SOLTAS – COPLAS”.

Nele surgem alguns versos que retractam o que era a vida nesses tempos. Com todo o gosto os transcrevo.

 

MIUDO

Ao vento, à chuva, ao sol pela Ribeira,

Descalço e quasi nu; Eis meu tormento.

Orfão de pai, sem ter eira nem beira…

E ninguém compreende o meu lamento.

 

Que vida a minha…

Roubar sardinha

Para a fome mitigar.

Minha avozinha,

‘Spera o que eu lhe hei-de levar.

De lés a lés,

Aos pontapés

Todos me chamam ladrão.

Ai, não existe

Vida mais triste,

Mais amargurado pão.

 

Mas tenho fé em Deus Nosso Senhor,

Na protecção do seu divino olhar.

Todas as noites peço com fervor

Para crescer, ser homem, trabalhar.

 

FADO DE PENICHE

Peniche, terra de lendas,

Romanescas tradições,

Os teus rochedos e rendas

Prendem nossos corações,

Como os mórbidos desejos

Nos enlaçam dominantes;

Como a doçura dos beijos

Prende os lábios dos amantes.

 

Peniche,

Prodígio da natureza…

Peniche,

De belezas sem egual...

Peniche,

És da costa portugueza,

Peniche,

A rainha sem rival.

 

Mãos de fada, sem cessar

Seu encantado labor,

Tecem rendas de luar

Num sonho terno de amor;

Enquanto mãos calejadas,

Com ardor e valentia,

Sobre ondas encapeladas,

Lutam, lutam… dia a dia.

 

VARINAS

Na gente da beira-mar

Nós somos

Uns salpicos joviais

Levando a vida a cantar:

É fresco!...

Hoje é barato de mais!...

Um dia sem vendaval

E então

Nosso canto é mais dolente,

E atenuamos o mal,

Dizendo

Que o cantar faz bem à gente

 

Varinas,

Passam lestas a correr,

Para a sardinha vender,

Numa constante canção.

Varinas,

Giga à cabeça sorrindo,

Alegres vão repetindo

O seu risonho pregão.

 

Temos um sonho de amor…

Singelo.

É toda a nossa ambição

Um humilde pescador

P’ra darmos

Inteirinho o coração

E partilhando esse amor,

Juntinhos,

Possamos ter a alegria

De trabalhar com ardor,

Ganhando

Para o pão de cada dia.

 

COSTUREIRAS

Costureirinha

Vê bem a linha,

 

Eu tenho a agulha e o dedal

Na tua mão!...

E por ser’s bela,

Toma cautela,

Não descosas por teu mal

O coração.

Olha que o choro, muitas vezes

Das distracções é que vem.

Tem na vida muito siso,

Perdes…a linha também.

 

Eu já as tenho avisado

Que há por aí grande lote

De sedutores aldrabões;

E é preciso ter cuidado,

Para não irmos no bote,

Por causa das confusões.

 

Assim mesmo é que é falar.

Pois é melhor prevenir

Em vez de remediar.

E p’ra ninguém construir

Falsos castelos no ar,

É melhor pois repetir:

 

Costureirinha, etc, etc,

 

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