A EUTANÁSIA E O MITO DE SISÍFO – 1ª Parte
Também eu quero aqui e agora emitir a minha opinião sobre
essa matéria. O pensar em eutanásia, fez-me lembrar o mito de sisífo.
Recordo-vos Sisífo da mitologia grega:
“uma personagem,
condenado a repetir sempre a mesma tarefa de empurrar uma pedra até o topo de
uma montanha, sendo que, toda vez que estava quase alcançando o topo, a pedra
rolava novamente montanha abaixo até o ponto de partida por meio de uma força
irresistível, invalidando completamente o duro esforço despendido.”
Assim é a
nossa tomada de consciência sobre se devemos ou não continuar a viver. Foi aqui
que recuperei a memória de um livro que tinha comprado na “livraria Cerdeira em
1/12/1960” tinha eu portanto 16 anos, de Albert Camus (prémio Nobel) sobre o
suicídio e o absurdo. E aqui se prendem as linhas gerais da decisão última de
um Homem, saber se merece a pena continuar a viver. Decidi então dividir o meu
pensamento em duas partes. Terminar a vida segundo Camus, na sua complexidade
com o absurdo e depois dizer eu o que penso.
Ficam estas
considerações à vossa análise, partindo desde já do entendimento que o único
senhor de si próprio é o individuo ele mesmo.
Quadro de Tiziano Vecellio
O ABSURDO E O SUICÍDIO
Texo de Albert Camus - Enciclopédia LBL, tradução de Urbano Tavares Rodrigues
Texo de Albert Camus - Enciclopédia LBL, tradução de Urbano Tavares Rodrigues
"Só existe um problema filosófico realmente sério: é o
suicídio. Julgar se a vida vale ou não vale a pena ser vivida é responder à
questão fundamental da filosofia. O resto, se o mundo tem três dimensões, se o
espírito tem nove ou doze categorias, aparece
em seguida. São jogos. É preciso, antes de tudo, responder. E se é verdade,
como pretende Nietzsche, que um filósofo, para ser confiável, deve pregar
com o exemplo, percebe-se a importância dessa resposta,
já que ela vai preceder o gesto definitivo. Estão aí as evidências que são
sensíveis para o coração, mas é preciso aprofundar para torná-las claras à
inteligência.
Se me pergunto em que julgar se uma questão é mais
urgente do que outra, respondo que é com ações a que ela induz. Eu nunca vi
ninguém morrer pelo argumento ontológico. Galileu, que detinha uma verdade
científica importante, abjurou-a com a maior facilidade desse mundo quando ela
lhe pôs a vida em perigo. Em um certo sentido, ele fez bem. Essa verdade não valia
a fogueira. Se é a Terra ou o Sol que gira em torno um do outro é algo
profundamente irrelevante. Resumindo as coisas, é um problema fútil. Em
compensação, vejo que muitas pessoas morrem por achar que a vida não vale a
pena ser vivida. Vejo outras que paradoxalmente se fazem matar pelas ideias ou
as ilusões que lhes proporcionam uma razão de viver (o que se chama uma razão
de viver é, ao mesmo tempo, uma excelente razão para morrer). Julgo, portanto,
que o sentido da vida é a questão mais decisiva de todas. E como responder a
isso? A respeito de todos os problemas essenciais, o que entendo como sendo os
que levam ao risco de fazer morrer ou os que multiplicam por dez toda a paixão
de viver, provavelmente só há dois métodos para o pensamento: o de
La Palisse e o de Don Quixote. É o equilíbrio da
evidência e do lirismo o único que pode nos permitir aquiescer ao mesmo tempo à
emoção e à clareza. Em um assunto simultaneamente tão modesto e tão carregado
de patético a dialética clássica e mais sábia deve, pois dar lugar -convenhamos
- a uma atitude intelectual mais humilde e que opera tanto o bom senso como a
simpatia. O suicídio sempre foi tratado somente como um fenômeno social. Ao
invés disso, aqui se trata, para começar, da relação entre o pensamento
individual e o suicídio. Um gesto como este se prepara no silêncio do coração,
da mesma forma que uma grande obra."
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