AS PORTAS
QUE ABRIL ABRIU
Compreendo
perfeitamente os meus amigos da minha idade ou à volta disso que sonharam em
viver num país em que as liberdades não fossem uma mera utopia. Compreendo os
que entregaram a sua vida a uma luta desigual contra os que dominavam o poder
económico e político num país em que só o sol parecia nascer por igual para
ricos e pobres.
Compreendo
os meus amigos que descalços e doentes e pobres, tinham dificuldade em perceber
porque tudo lhes tinha de ser adverso.
Alguns
emigraram. Foram para países em que continuavam a levar a mesma vida de trabalhadores
esforçados. Mas só que eram bem pagos para o serem. Mas nunca perceberam que
naqueles países se vivia uma outra face da mesma moeda. Surgiam perante os que
cá ficavam (nas suas férias) como vencedores. Mas o seu dia-a-dia nos países da
emigração, não deixavam de ser um esforço constante e desumano para poderem
mostrar-se vencedores. Poucos olhavam à sua volta e tentavam compreender as
suas vidas. Foram para lá civicamente analfabetos e assim continuavam. Não os
censuro nem julgo. O seu 25 de Abril foi a força do seu trabalho e a sua perseverança.
Admiro-os. Afinal eram prisioneiros no seu país e continuaram prisioneiros como
emigrantes. Lutaram contra xenofobias, contra racismos. Lutaram por serem
aceites e nunca o conseguiram totalmente. Afinal o drama dos refugiados de hoje é o mesmo
que os portugueses viveram nas décadas de 50, 60 e 70 do século passado.
A diferença
está em que hoje o analfabetismo (ou a iliteracia) não se nota. Não é
necessário escrever. Existe o telemóvel que entretanto se proletarizou. E
existe o skype e o viber. Hoje somos emigrantes diferentes. Emigramos de nós
próprios. Somos o momento. Não é necessário aprofundar conhecimentos, nem ler.
Tornou-se tudo intuitivo. Vivemos num exílio constante e só não demos por isso.
Introduziram-se métodos de enriquecimento rápido (e ter dinheiro é que é importante),
basta raspar, ou vender droga, ou traficá-la. Ou prestarmo-nos à exibição
minuto a minuto dos nossos podres numa qualquer televisão.
Como pois
quereis vós que quase meio século depois ainda alguém se interesse pelo sacrifício
de meia dúzia de malucos que não tinham vida própria.
Abril abriu
as portas que dão para uma forma de liberdade nunca sonhada. A de ser livre de
recordações que nos pesam sobre os ombros. A de escolher as minhas próprias
dores. Quero lá saber de prisões ou de presos políticos. Celebrar o 25 de Abril
é viver amarrado a tempos em que ninguém já quer viver.
Abril abriu
as portas que dão para um mundo em que sou eu que escolho as minhas lutas. Não
as que me pretendem impor. Afinal celebrar o 25 de Abril é celebrar um passado
em que já ninguém se revê.
Voltar à
prisão politica uma vez por ano é revisitar fantasmas mal arrumados nas
prateleiras da História. Preservar prisões é esquecer que são os ideais de
Liberdade, Igualdade e Fraternidade que importa glorificar.
PS: - Já depois de editado este post vi o programa das celebrações do 25 de Abril organizadas pela Câmara Municipal dos ilustres camaradas do PCP. Não retiro uma letra ao que escrevi e estranho que aquilo que era a imagem de marca do PCP, o foguetório à meia-noite tenha desaparecido completamente. Porque naquelas cabeças era um foguete por cada ano e francamente 43 foguetes era um pouco incómodo. Mas podiam ser 25 alegorizando o 25/4. Mas capacidade criativa perdeu-se no tempo.
PS: - Já depois de editado este post vi o programa das celebrações do 25 de Abril organizadas pela Câmara Municipal dos ilustres camaradas do PCP. Não retiro uma letra ao que escrevi e estranho que aquilo que era a imagem de marca do PCP, o foguetório à meia-noite tenha desaparecido completamente. Porque naquelas cabeças era um foguete por cada ano e francamente 43 foguetes era um pouco incómodo. Mas podiam ser 25 alegorizando o 25/4. Mas capacidade criativa perdeu-se no tempo.
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