sexta-feira, setembro 14, 2012

O QUADRO FORA DA PAREDE
Nos tempos em se jogava ao “chepe” aos sábados e domingos à tarde, juntavam-se ali o Zé Travassos, o Zé Ferreira, o Carriço, o Jabaja, o Júlio, o Dionizio Costa, o Arrazador, e muitos, muitos outros já desaparecidos na sua maior parte. Entre eles figurava um algarvio, o Zé Bernardino, que foi mestre de Fábrica de conservas e era senhor ao mesmo tempo de um mau feitio terrivel e de um sentido de humor completamente invulgar. A disputa do jogo em questão provocava cenas de zangas incontáveis durante uma tarde e algazarras completamente ensurdecedoras. O Zé Bernardino era certo e sabido fazia sempre parte das discussões mais acesas.
Num determinado dia em que a guerra de palavras já se estendia por algum tempo entre alguns dos que jogavam e o inevitável Zé Bernardino, em que um e outro já se tinham levantado da cadeira com ar ameaçado, o Algarvio a certa altura cala-se, olha para o seu interlocutor mais directo olhos nos olhos e diz-lhe de forma fulminante: “Ah seu home, você cale-se porque não passa dum quadro fora da parede!”.

Fiquei muito tempo a pensar naquela expressão. Sabendo que os quadros existem para serem pendurados, um que está fora da parede atingiu o fim da sua utilidade. Porque ninguém olha para ele. Porque utiliza uma técnica tão errada que não há nada que o torne agradável ou minimamente aceitável.
É uma expressão demolidora sem ser mal-educada. No entanto pesa mais no seu significado final do que se utilizasse formas de calão grosseiro. É mais mortífera que uma bala. E no entanto não conduz a que alguém menos atento se sinta tratado grosseiramente e possa conduzir a cenas de pugilato sempre indesejáveis, ou a processos judiciais sempre desagradáveis.

Ao recordar o Zé Bernardino, recordo a sua frase de peso e remeto-a direitinha para o actual governo e para os seus ministros. São uns autênticos “quadros fora da parede”. Estão esgotados. Mortos. Sem valor. Imprestáveis. Prontos para o lixo.
Obrigado Zé Bernardino por me teres ensinado a insultar estes pedaços de excremento, sem que me possam culpar de estar a ser injurioso.

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