quinta-feira, dezembro 15, 2016


A FÁBRICA DA RAMIRA

Era assim que lhe chamávamos. Hoje é mais uns escombros fantasmas que se vão deteriorando sem honra nem glória. Ao passarmos por ali, sentimos o declínio da vida industrial da cidade de Peniche.

Não mais as mulheres a cheirarem a peixe que passavam em frente à Nau com quem mimoseávamos com piropos pouco elegantes e que da parte delas recebiam o troco devido.

Não mais os carros a transportarem peixe passando na rua central de Peniche e os apitos das fábricas chamando as conserveiras para se apresentarem ao trabalho.

E as pessoas que viviam nas casas da fábrica. Tantos amigos e amigas de todos nós. Tudo se desmoronou.

É em nome de tudo isto que me atrevo a levantar aqui um repto ao executivo da Câmara Municipal de Peniche e aos (às) deputados (as) municipais.

Porque não concorrer a fundos comunitários que no actual Quadro tem cabimento e adquirir a Velha Fábrica Ramirez, transformando-a num museu industrial vivo do que foi durante muitos anos a actividade conserveira em Peniche. Já perdemos a Frigorifica. Já perdemos a Congelação. E outra e outra fábrica. Porque haveremos de perder este último exemplar de uma época que foi determinante no desenvolvimento de Peniche?

Porque é que os nossos representantes do PCP, PSD e PS não unem esforços conjuntos para atingir este objectivo?

Seria uma prenda para os nossos filhos e para os filhos dos nossos filhos de uma memória que de outra forma ficará irremediavelmente perdida.

Pensem nisto por favor.
PS:
Em 2003 num Jornal de que fui Director (Peniche-Directo) publiquei o seguinte que agora repesco:
DESERTO
Incúria Gravosa
“O progresso de Peniche é o testemunho do valor dos seus pescadores”
As fotos falam por si. No Bairro dos Pescadores, em Peniche Cima, mais uma unidade industrial que contribuiu para o progresso de Peniche, “Algarve Exportador”, foi demolida para dar lugar a uma nova urbanização. Que 99% dos habitantes de Peniche não sabe o que será. Quando o PS local era oposição, na Assembleia Municipal batia-se para que os editais de construção fossem elucidativos sobre os projectos aprovados. Agora qué é governo local, comporta-se com a mesma indiferença e a mesma arrogância perante os munícipes que aqueles que criticou.
Mas mais importante que tudo isto, é a face oculta que tudo isto esconde. Vejamos.
Que nos recordemos de repente, nos últomos anos desapareceram definitivamente, a “Benito Garcia” que sucedeu à “Exportadora” para dar lugar a uma grande superfície, a “Fábrica do Fialho” que se dividiu entre uma nova unidade industrial e um empreendimento imobiliário, a “Congelação” que já tem projecto imobiliário aprovado e agora a “Algarve Exportador” com um loteamento já em execução.
Isto significa que das “velhas” fábricas de conserva da 1ª metade do século XX, que tanto contribuíram para o crescimento de Peniche, que conduziram a correntes de migração de toda a costa portuguesa, do Minho ao Algarve, resta uma memória que aos poucos se vai acabando. E, no entanto, todos hoje somos consequência desse património que se perdeu. Não podemos esquecer aqui uma outra unidade desaparecida, mas que até agora tem sido poupada aos apetites vorazes do cimento armado, referimo-nos à Central eléctrica.
Falamos do progresso de Peniche como resultado do valor dos seus pescadores. Mas para além de uma frase o que fazemos ou fizemos? Porque é que 27 anos de poder local democrático, nunca se preocuparam em preservar para o futuro, pelo menos  parte do equipamento dessas fábricas de forma a constituir para o Futuro um Museu Industrial? Que vai restar para as gerações futuras do passado de Peniche?
Daqui a uns anos quem vai saber o que era um autoclave ou um gerador eléctrico do sec.XX? Quem pôde ver estas unidades em laboração com os seus tubos e condutas em cobre e aço, com as suas câmaras de frio e de cozedura, com as bancadas de estripamento, com as máquinas de soldar, não pode deixar de sentir um calafrio por essa escola estar irremediavelmente perdida.
O Museu Industrial de Peniche, com peças-maquinarias que contribuiram decisivamente para o nosso progresso e desenvolvimento não mais será possível, por incúria ignominiosa de sucessivos executivos municipais.  
        A História da nossa terra os julgará.

Sem comentários: