Vivi sem interrupção até aos 16 anos em Peniche. Que me recorde este viver teve umas breves incursões de férias na Atouguia da Baleia e uma ou outra ida aqui ou ali com o meu pai.
Nesse tempo Peniche não passava de um bocado de terreno com umas quantas casas, todos os habitantes se conheciam uns aos outros e estava fora de causa entre ao jovens e adolescentes, cruzarmo-nos uns pelos outros sem uma saudação (Óiiiii!) ou sem uma “pedrada”. A distância entres as duas coisas era se pertencíamos à mesma “companhia” ou a “companhias adversárias”. Nunca éramos indiferentes uns aos outros.
Outros acabavam a Escola Industrial e iam para as Oficinas Gerais de Material Aeronáutico em Alverca, ou para a Casa Hipólito em Torres Vedras, ou para a Sorefame, para a Siderurgia no Seixal e nesses locais de culto da nossa incipiente indústria Nacional, aprendiam a desmamar-se de Peniche e a tornarem-se cidadãos do pequenino mundo português.
Uma pequena minoria continuava a estudar e a sua independência era mais demorada e menos dura. Teriam de passar alguns anos e com a vida militar nasciam então para um novo estatuto mais adulto.
…Agora passados mais de cinquenta anos sobre isto tudo, é possível encontrarmo-nos sem nos cumprimentar-mos. Por onde se perderam aqueles Óiiiiiiiiiis? Em que percurso, em que guerra, em que partilha ficou aquela costela penicheira que nos aproximava uns dos outros?
Porque é que teve de ser assim? Porque não ficou o encantamento que era a gente reconhecer-se no Niassa quando partíamos para uma guerra que não era nossa.
Porque não resta aquela noite de boémia dos bares de Luanda ou de Nampula…
Ou a alegria que era irmos todos em excursão para ver o Peniche jogar em festa contra o Sintrense ou o Olhanense…
Hoje muitos de nós somos indiferentes uns aos outros. O que ganhámos com isso? Tornámo-nos melhores? Não o creio. Só sei que não sei, onde ficou a nossa inocência. Onde a sepultámos. E porque nos continua a faltar força e coragem para a fazer renascer.
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