segunda-feira, abril 30, 2007

Recordações do início do século XX:
– O meu avô Benjamim
O meu avô chamava-se Benjamim Costa. Morreu em 1954 (tinha eu 9 anos) com 62 anos de idade. Era funcionário dos Serviços de Correios, Telégrafos e Telefones do Distrito de Leiria. O seu local de trabalho era o posto semafórico que se situava onde hoje se encontra o “Restaurante Nau dos Corvos”.
O posto semafórico era o polícia sinaleiro dos navios que cruzavam o atlântico junto à nossa costa. Havia lá um grande mastro com várias cordas, onde se subiam bandeiras de cores garridas e desenhos variados, com que se faziam perguntas e se davam respostas aos navios que passavam.
Um pouco afastada do posto semafórico havia uma armação em madeira e ferro, com umas palhetas que mudavam de posição, o que permitia com a luz do sol reflectida enviar em morse para os barcos, as informações mais diversas.
Havia dentro do posto uma máquina em cobre, de morse, que o meu avô dedilhava de forma tal, que os meus olhos se trocavam todos ao ver a rapidez com que o fazia.
Tenho saudades destes objectos que desapareceram e que faziam a memória da importância de Peniche detinha nas actividades comerciais marítimas.
O meu avô era um republicano dos quatro costados. Adepto do Afonso Costa. Em 1926 o meu avô era um homem cheio de convicções e de sangue na guelra. Ele e outros companheiros de jornada da época não se adaptaram às mudanças que se adivinhavam.
Envolveu-se com outros penicheiros desse tempo em diversas actividades de afrontamento às autoridades que passaram a exercer o poder localmente. Assim é que em 1927 o meu avô com um grupo de cidadãos foram detidos por crimes políticos. Porque a cadeia de Peniche era exígua para tanta gente, foram confiados à guarda da guarnição militar que se encontrava na Fortaleza.
Assim se iniciou, com este grupo de penicheiros, aquilo que viria a ser a prisão política de Peniche. A foto abaixo mostra esse grupo posando no interior da Fortaleza, no período da sua detenção em Fevereiro de 1927. O meu avô Benjamim é o segundo a contar da esquerda na fila do meio. O regime ao longo dos anos foi-se aprimorando no tratamento dado aos seus presos políticos, e fotos como esta nunca mais foram possíveis.
Recordo anos mais tarde o meu avô já doente e impossibilitado de andar, sentado numa cadeira e a tratar dos seus selos. Inúmeros amigos o procuravam em casa a pedir-lhe conselhos ou ajuda para tratar dos mais diversos assuntos, pois ele era uma enciclopédia de saberes.
O meu avô continuou um republicano e um democrata até ao fim da sua vida. As minhas referências ainda hoje se dividem entre a bonomia do meu avô Benjamim e a firmeza do meu pai Horácio.
Entre eles girava como ficura omnipresente a minha avó Guilhermina “Baterremos”, matriarca que dominava marido, filho e netos. A cangalheira cá do sítio. Que era uma figura que a mim me infundia medo.
O meu avô de fortes convicções políticas (dando sempre oportunidade aos outros de manifestarem a sua opinião e procurando evitar conflitos interpessoais, e o meu pai antipolítico por essência, sempre senhor da última palavra, contundente, felina, definitiva.

O meu avô foi o primeiro político que conheci, admirei e admiro. Presto-lhe aqui a minha homenagem.

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