sexta-feira, junho 08, 2012

SER (ESTAR) PRÓXIMO

Ontem passei uma parte importante da minha tarde a fazer arrumações nos armários do meu local de “trabalho”. Nessa tarefa foi inevitável abrir as caixas da correspondência. Estão lá centenas de cartas, postais, telegramas e aerogramas que registam para sempre o percurso da minha vida.
São dos meus tempos de viver em Peniche. De quando era estudante em Lisboa. Do meu percurso como professor de norte a sul do País e dos meus tempos da Guiné-Bissau. Aquela correspondência daria para criar livros pois no seu conjunto são histórias de vidas, de lutas, de desafios, de preparação de movimentos que despertariam Peniche da sua longa letargia. É a história da ocupação colonial vista por quem passou por ela como o Álvaro Zé e o Colaço. É a preparação das iniciativas juvenis com os esquemas de acção traçados ao longo das viagens por esses portos europeus, com a letra metódica e miudinha do Carlos Mota. São as cartas vindas de Peniche e que me chegavam a Bissau com o relato dos 2 primeiros anos pós 11 de Novembro.
São as cartas das mulheres que me amaram enquanto durou o meu deambular. São os postais de aniversário que me endereçaram ao longo de toda a minha vida. Toda essa correspondência veio a ser interrompida com o advento dos computadores e dos telemóveis. De tal forma interrompida que se tornaram documentos quase históricos para mim. Deles não me vou desfazer haja o que houver. Nem do postal de parabéns que a Silvina “caracoleira” me enviou, nem do ofício da PIDE/DGS que me interditou o regresso ao concelho de Alcobaça para lá tornar a leccionar. Quando tiver netos, quero que eles saibam como era o mundo na década de 40, 50, 60 e 70 do séc XX. Como os “cotas” comunicavam entre si antes de haver sms e tablets. E a gente entendia-se. Porque tínhamos tempo para pensar no que nos diziam e no que deveríamos responder. Éramos senhores do tempo. E o tempo não se apagou das nossas memárias. As minhas e as dos meus amigos estão arquivadas em caixotes nos meus armários. Todas elas. Coisas boas e más. Cartas de amor e cartas de ódio. Documentos que me tornaram gente grande e as reprimendas do meu pai que me chamavam a atenção para as asneiras que eu ia cometendo. Hoje limpam-se as memórias dos telemóveis e dos PCs e o que resta? Daqui a 50 anos quantos de nós terão espólio que dê aos seus filhos e netos uma ideia ainda que aproximada dos que os antecederam?

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