Já não me recordo quais as circunstâncias e quem foi que o proferiu, mas sei que foi há pouco tempo e referindo-se ao momento que vivemos, suscitou a questão de que a União Europeia era o exercício de uma acção colonialista dos países do Norte da Europa, sobre os países periféricos.
Dir-me-ão que a situação se deve ao facto das dividas que temos para com um grupo de entidades financeiras, com as exigências desses grupos para receber o que considera que lhe devemos.
O colonialismo sempre foi o exercício de um poder económico com o apoio da força musculada, sobre povos de onde são sacados todos os seus bens e que continuam à mercê de uma divida infinita.
Deixem-me contar-vos uma história verídica. Quando eu tinha 17 anos e estudava em Lisboa, inscrevi-me num curso de Formação Ultramarina organizado pela Mocidade Portuguesa. As classificações que obtive nesse curso foram distinguidas com uma viagem de um mês a S. Tomé e Príncipe.
Enquanto estive nessa colónia portuguesa fiquei alojado na Roça de Monte Café, onde se extraía cacau que era vendido nos mercados internacionais. Haviam umas quantas roças em S. Tomé. A generalidade dos trabalhadores dessas roças, eram angolanos e cabo-verdianos que eram retirados dos seus locais de origem e eram obrigados a trabalhar nessas fazendas de cacau, sob a vigilância das tropas coloniais. A viagem que eram obrigados a fazer era-lhes debitada para ser descontada nos seus miseráveis salários. Chegavam às roças e eram alojados nas casas dos trabalhadores rurais e a renda da casa era-lhes debitada para ser descontada. Todas as roças dispunham de um Armazém onde eles poderiam fazer as compras, sendo o valor dessas compras descontado nos seus salários. As roças tinham Hospitais para os trabalhadores. O tratamento de doenças (normalmente malária) era-lhes debitado. Isto é, quanto mais vivessem mais dinheiro ficavam a dever aos colonos proprietários das roças. Nunca deixavam de ser devedores. E o que ficava por pagar era debitado aos seus descendentes, mulher e filhos. Eram eternamente devedores. Havia formas lúdicas para que os colonizadores e os seus capangas pudessem sentir-se menos tristonhos. Uma delas era a violação sistemática das filhas e mulheres dos trabalhadores. Daí a velha expressão de que “deus criou o preto e o branco, os portugueses criaram os mulatos. Tudo isto com a bênção da Santa Madre Igreja.
Assim era nos séculos anteriores. Hoje criou-se um sistema paralelo de colonialismo dos países ricos sobre os países pobres. É aquele que estamos a viver em Portugal, Espanha, Itália, Grécia e Irlanda. Vejam as similitudes. Os países que foram berços de civilizações e de expansão em todo o globo terrestre, são hoje as vítimas da voragem do dinheiro sem rosto e de homens sem escrúpulos. Que são apátridas. Porque a sua pátria é o dinheiro e o poder que este lhes confere. São gente de todas as nações (incluindo a nossa) que a troco de uma visão de consumo, torna as pessoas (e os países) eternamente devedoras. É uma forma mais sofisticada de colonialismo. De onde os capatazes, tão devedores como nós, tiram alguns miseráveis proveitos, dando rosto e razão de ser aos detentores da alta-finança. Não somos filhos da pouca sorte. Somos o resultado da decadência de valores e de sentido ético de existência. Não é por acaso que a filosofia se tornou obsoleta nas nossas escolas. Não é por acaso que o estudo cívico e a leitura comentada da constituição se deixou de fazer.
A Democracia, a Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade, tornaram-se démodés.
PS: deixo-vos uma morna de Cesária Évora que relata o sofrimento dos trabalhadores de Cabo Verde que eram desterrados para S. Tomé e Príncipe
http://www.youtube.com/watch?v=dNVrdYGiULM
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