Em 1974
foi Abril. Abriram-se as portas das prisões. Jornalistas e escritores
reaprenderam a escrever. Os soldados voltaram para as suas mães, mulheres,
namoradas e irmãs. Os hospitais abriram as suas portas a todos pobres e ricos.
A falta de trabalho deixou de ser um pecado. E as crianças a quem os
professores deixaram de agredir para aprender, entravam nas escolas com um
sorriso nos lábios e um sonho para cumprir. Não mais os ramais de caminho-de-ferro
e a falta de livros foram razões para chorar. A pedra e a pena na sacola de
linhagem passaram à pré-história. Todos podiam frequentar a escola e quem
tivesse mais dificuldades recebia apoio que os permitisse aprender sem o
estômago vazio. As crianças deixaram de ter de faltar à escola para ir
trabalhar numa ajuda solidária à economia de sobrevivência das famílias. Não
mais roubar peixe na ribeira. Não mais pedir pelas ruas e fazer filas ao sábado
à porta dos ricos para a esmola habitual. Não mais as crianças filhas de pai incógnito
e não mais pessoas perseguidas por serem diferentes e pensarem de forma
diferente.
Nas
décadas seguintes ficaram os slogans que exaltavam estas conquistas. “25 de
Abril Sempre”. “O Povo Unido jamais será Vencido”.
Até que
os cravos murcharam. O elogia da República deixou de ser a 5 de Outubro. E 1 de
Dezembro não mais cantou a libertação do jugo estrangeiro. Deputados dizem que
Abril é uma história sem sentido e os mais altos magistrados e responsáveis da
Nação ofendem e atentam todos os dias contra a Constituição que juraram
defender e acatar. Fecham escolas e hospitais. Voltaram as sopas dos pobres. E
de novo para ir ao médico é preciso dinheiro que falta para comer. Os jovens
são obrigados a exilarem-se e ter ambição depende da riqueza dos pais lá em
casa. Ter casa deixou de ser um direito para passar a ser um luxo. De novo
regressaram os tempos da II Grande Guerra com a existência de senhas para ter
acesso a bens essenciais.
Que
parte desta história é que vocês não perceberam?
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