segunda-feira, outubro 14, 2019


PRO PORTUGAL

Não há ano algum em que se realize uma etapa do mundial de surf que não me teletransporte para os anos 50 do século passado. Nesse tempo era Presidente da Câmara Municipal o António Bento, e a alma mater da Câmara era o Fernando Lopes da Silva. O António Bento foi nomeado presidente pelo Governo da Ditadura Nacional. E o Lopes da Silva era um criativo da época todo virado para as actividades desportivas do mar (ou não fosse ele o 1º proprietário da PROPESCA) e ainda para actividades lúdicas que levassem ao país a designação “Peniche”. Foi ele o autor da canção de Peniche, cantada por Maria de Lurdes Resende e que se me é permitido o remoque, deveria ser reeditada pela Câmara Municipal pois não conheço melhor que esta.

Nesse tempo, por volta dos meses de Setembro/Outubro, víamos chegar a Peniche, mais concretamente à Praia do Molhe Leste, umas carrinhas da Volkswagen com uns tipos cabeludos e descalços que aqui se deixavam ficar até aos meses de Março/Abril. A sua actividade era a de comer (pouco), beber (muito), fumar umas coisas esquisitas, dormir com as suas gajas nas carrinhas e, durante o dia, com umas pranchas de madeira deixar-se apanhar por ondas e deslizar sobre as pranchas com o impulso das vagas, deitados nelas ou em pé. No fundo era aquilo que nós aqui fazíamos com o corpo mas eles eram mestres na arte de navegar em madeira sobre as ondas.

Não era na zona apoiada por banheiros que eles o faziam. Era um pouco mais distante e às tantas começamos a ouvir as palavras super e tubos embora que há 60/65 anos não conotássemos aquele linguajar com alguma coisa que nos fosse próxima.

O que ouvíamos na Vila é que se tratava de bêbados e drogados, pés-descalço que não traziam nada de novo ao turismo que era desejável em Peniche. Essas tretas também não nos diziam nada. Era uma terra pequenina, habitada por gente ultra conservador, beateira e de pequeninas mentalidades. Para nós importante era a novidade e o sentido de liberdade que aquela gente imprimia às suas atitudes e que nos faziam perceber como estávamos presos aqui em Peniche.

Foram esses jovens que levaram para as suas terras, Alemanha, Austrália, EUA, fotos de um sitio porreiro em Portugal para apanhar ondas, chamado Péniche, onde a vida era barata e a comida boa e muitas vezes gratuita no que tocava a peixe. Ao mesmo tempo apanhavam-se uns tubos espectaculares e bom seria que àquele sítio se começasse a chamar na Europa, os super-tubos.

Assim nasceu a lenda, que se tornou realidade.

Passados 70 anos, quem é Lopes da Silva? Quem é o António Bento? Mas os Supertubos são conhecidos no mundo global. Com a bênção de cabeludos e pés-descalços.   

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