sábado, outubro 27, 2007

GENTE COM COLUNA VERTEBRAL
Num tempo em que cada um se adapta às circunstâncias para poder com isso obter os dividendos que almeja, sejam eles financeiros ou de influência pessoal nos bastidores do poder, sabe bem pensar nos que nunca se deixam vergar perante nada.
Uma das pessoas que assim se comportou ao longo de toda a sua vida foi o meu pai. Quem o conheceu sabe que ele assim era. Homem de antes quebrar que torcer. Da escola com que se moldaram as pessoas que com esforço, trabalho, honestidade e saber foram construindo Peniche. Não é por acaso que a partir de certa altura as pessoas o passaram a designar por “Mestre Horácio”. A sua oficina era o ponto de retorno de quantos de Peniche emigraram para terras de França e da Alemanha, para buscarem noutras paragens o que a terra madrasta negava.A oficina do “Mestre Horácio” foi escola de formação profissional de técnicos de Serralharia Mecânica, de Serralharia Civil, de Bate-Chapas. Alguns dos melhores mecânicos que por aqui houve foi ali que aprenderam o seu ofício, numa aprendizagem suada e dura. Aprender a ser mecânico ali, era tirar a licenciatura. Naquele local não se ministravam bacharelatos.
Ali nasceu a primeira Escola de Condução de Peniche, que o “Carlos Maluco” construiu com caixas de peixe da Congelação, no pátio da oficina. E os alunos aprendiam a arte de conduzir e mecânica prática num 2 em 1 inigualável em qualquer outro lugar.
À oficina do “Mestre Horácio” acorriam todos os aflitos. Desde o Florêncio Ramos ao Minó, desde o Luís Correia ao Pisa-o-Risco.
Ali acorreu um dia um Chefe da Pide aqui colocado de novo, Batista de seu nome, que conhecia o meu pai de nome mas não de feitio e atitudes. O carro do Pide tinha tido um problema qualquer e deixara de fazer piscas e as luzes de stop não acendiam.
O meu pai tinha em relação aos Pides a atitude de ignorá-los altivamente. O seu pai tinha inaugurado a Fortaleza como prisão e ele pequenito ia levar a comida que a minha avó fazia para que o marido tivesse um pouco mais de conforto. Prometera a si próprio que a ele isso jamais aconteceria. O Chefe da Pide era pois um cliente como outro qualquer, embora ele soubesse bem que tipo de finório tinha lá posto o carro a arranjar.
Quando chegou a vez do carro ser visto, abriu-lhe o capot, foi à caixa de fusíveis e depressa descobriu que tinha havido um curto circuito que tinha dado cabo de fusíveis e lâmpadas. Lá arranjou os fios descarnados, substitui o que estava avariado, experimentou as luzes, verificou que estava de novo tudo em ordem, fechou a tampa da caixa dos fusíveis, fechou o capot e deu por findo o arranjo. Ao fim da tarde o Chefe Batista foi ver se o carro estava pronto. Estava. Perguntou pelas chaves do carro e o “Mestre Horácio” disse-lhe que estavam na ignição. O Chefe entrou no carro, pôs o carro a trabalhar, e preparou-se para se ir embora agradecendo ao Snr. Horácio a reparação. Foi então que se ouviu a voz inconfundível do “Mestre Horácio” que lhe disse com veemência:
- Oh Snr. Batista! Olhe lá… Você manda-me tirar as calças e eu baixo-as. Manda-me tirar as cuecas e eu tiro. Manda-me baixar para me ir ao cú e eu baixo-me. Mas uma coisa na faço. È meter vaselina para ser mais fácil. São 25$00 que foi quanto custaram as lâmpadas e os fusíveis fundidos.
O chefe da Pide pagou e só depois saiu com o carro.